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19 de julho de 2010

PROVOCAÇÕES ECONÔMICAS



PROVOCAÇÕES ECONÔMICAS:
MAIS PERGUNTAS QUE RESPOSTAS, MAIS DÚVIDAS QUE CERTEZAS

Por Marcus Eduardo de Oliveira (*)


Com a fama de termos um linguajar sibilino, nós economistas, quase sempre, somos pouco compreendidos em nossas análises pelo público em geral. Essa pouca compreensão piora, sensivelmente, quando o assunto versa sobre previsões econômicas – espécie de tarefa predileta de alguns, e verdadeiro “ganha-pão”, de outros profissionais da área.
O fato é que fazendo uso de modelos econométricos cada vez mais rebuscados, abusando das variáveis (endógenas ou exógenas) matemáticas e “estimando” as mais diversas taxas e índices, desde o câmbio à inflação, dos juros ao nível geral de preços, passando pelos salários, a “salada econômica” proferida pelos que fazem “previsões” econômicas fica completa e muitos, do público em geral, ficam a ver navios, sem nada entender.
E não é de se admirar que a população em geral pouco entenda nossas “análises econômicas”, até mesmo porque, entre nós próprios, (eis o paradoxo dos paradoxos!) poucas vezes o consenso se estabelece. Eis que o dissenso, então, parece ser a regra desde que Adam Smith pôs luz na ciência econômica.
Dessa forma, a Economia (enquanto ciência) se “afunda” ainda mais na incompreensão do público em geral e torna-se, por conseqüência, pouco degustável. No entanto, é esse o “nosso mundo” em que sobram perguntas, mas faltam respostas convincentes. As dúvidas superam, de longe, as certezas e o non sense, por conseguinte, parece, por vezes, predominar.
Cristovam Buarque em, “Da ética à ética”, provoca um pouco mais. Diz que o papel do economista e do professor universitário de Economia é justamente esse: “viver a aventura de procurar e perguntar, sem esperar encontrar ou responder”.
Por aqui, clamamos por algumas respostas. Para tanto, façamos (e deixemos no ar) algumas perguntas.
Quem sabe, um belo dia, o economês (nossa linguagem tecnicista e rebarbativa) se torne acessível, digerível e, acima de tudo, compreensível para todos. Afinal, a Economia nasceu, enquanto ciência, para dar respostas afirmativas aos indivíduos, e não para complicar a vida desses. Toda e qualquer ciência, por sinal, precisa ser de domínio público, até porque ela precisa ser útil à sociedade e, de alguma forma, contribuir para a melhoria de todos.
Procuremos então “decifrar” o que segue, nesse vasto mundo dos economistas repleto de provocações e contradições:

1. Até quando a economia tradicional continuará ignorando em suas análises o ser humano?

2. A economia deve estar a serviço das pessoas ou são as pessoas que devem se pôr a serviço da economia?

3. O ser humano deve ser pensando como um “instrumento” do desenvolvimento ou, antes disso, deve ser entendido como o próprio fim do desenvolvimento, visto ser a economia uma ciência social?

4. O desenvolvimento precisa, de fato, do crescimento econômico? É possível um país se desenvolver sem necessariamente ter crescido economicamente antes?

5. O equilíbrio econômico impulsiona realmente a atividade econômica? Não seria melhor um pouco de desequilíbrio para alavancar o nível de atividade econômica? Talvez um excesso de demanda aqui, um choque de oferta ali, um pequeno aumento de preços acolá? Pode, de fato, uma calmaria geral (equilíbrio) impulsionar (fazer crescer) algo (o mercado), por exemplo?

6. A estabilização leva ao crescimento econômico ou é o próprio crescimento econômico, uma vez alcançado, que proporciona, doravante, uma boa e adequada estabilidade dos chamados agregados macroeconômicos?

7. A pobreza gera desigualdade social ou é a desigualdade social (um desequilíbrio econômico?) que faz aumentar (ou manter) o nível de pobreza?

8. Até quando a economia continuará sobrepujando o meio-ambiente?

9. Quando é que os economistas vão entender que a economia é apenas um subsistema do meio ambiente, dependente dele para tudo? Quando é que será percebido que as leis da Economia não dominam as leis da natureza?

10. Até quando será ignorado que existem limites físicos e ambientais para o crescimento?

11. Até quando a dita teoria econômica moderna continuará ignorando a Ecoeconomia e, principalmente, os trabalhos teóricos de Nicholas Georgescu-Roegen?

12. Quando um sistema econômico entra em profunda depressão, de quem é a culpa? Da economia ou dos economistas?

13. A tal “mão invisível” propugnada pelos clássicos ingleses realmente existe ou ela é, de fato, tão invisível a ponto de ninguém nunca ter visto, sentido ou tocado-a?

14. Pela lógica econômica atual devemos realmente considerar que a acumulação de bens leva à satisfação e ao prazer (utilidade) ou a busca pelo prazer e pela satisfação (hedonismo) envolvem outras varíaveis que a economia desconsidera?

15. Qual o real objetivo da Economia: a produção de riqueza ou proporcionar bem-estar as pessoas?

16. Deve à economia trocar a lógica do crescimento (vista pelo prisma da quantidade) pela lógica do desenvolvimento (cujo sinônimo é qualidade) ou o que realmente importa é o aumento da produção?

17. O ritmo econômico atual baseado na produção excessiva e no consumo desenfreado é sustentável ou já se esgotou?

18. Esse mesmo ritmo econômico caminha a passos largos para aumentar ainda mais a concentração de renda e de riqueza (nos países mais avançados) ou caminha para atenuar as gritantes desigualdades sociais e econômicas (nos lugares mais atrasados)?

19. Uma criança passando fome, dormindo ao relento, sem estrutura familiar e sem expectativa de melhora deve ser objeto de análise da macro ou da microeconomia? Ou isso é um problema de ética e não de teoria econômica?

20. Devemos ou não propor a troca do atual modelo de competição (que divide e exclui) pelo de cooperação (que soma e inclui)? Ou essa divisão/exclusão - soma/inclusão não é uma condição verdadeira?

21. A Lei de Pareto ou (Regra 80/20) que diz, por exemplo, que 20% dos vendedores de uma equipe produzem 80% dos resultados em vendas; que 20% dos clientes da sua empresa, garantem 80% dos resultados financeiros ou, em última análise, que em sua casa, no aconchego do lar, é quase certo que você usa apenas 20% do seu guarda-roupa em 80% do tempo disponível, ainda hoje, na correria do dia a dia a que somos acometidos, pode ser considerada como válida e pertinente?

22. Até quando os economistas continuarão a computar as externalidades negativas para a composição do valor do PIB?

23. No conhecido e propagado “mundo dos espertos” existe espaço para a prática pura da “concorrência perfeita”? E no mundo dos negócios, isso é plausível?

24. O preço sempre obedece a relação oferta-procura?

25. É possível afirmar que existe um momento no qual crescer economicamente acaba sendo prejudicial (gerando mais custos do que benefícios) ou isso é coisa de economistas-ecologistas que são, por conceito, pessimistas e catastróficos?

26. Toda ação do indivíduo, como propõe a teoria econômica, é economicamente racional ou existe espaço para a “prática” da irracionalidade econômica?

27. O Homo-Economicus sempre analisa a relação custo-benefício em suas atitudes mercadológicas?

28. Qual objetivo econômico-social deve ser perseguido primeiramente por uma (qualquer) nação: o aumento da riqueza dos que já são ricos ou a diminuição da pobreza daqueles que já são pobres?

29. O modelo de Economia Solidária, centrado nos valores da cooperação e da solidariedade, cabe dentro da “selvageria capitalista” dos dias de hoje?

30. A busca incansável pelo lucro é, de fato, a força motriz das economias modernas?

31. As relações igualitárias (justiça social e econômica) prevalecem em ambientes competitivos, marcado pelo individualismo em economias cada vez mais descentralizadas?

32. Qual das duas situações a seguir deve ter mais relevância no âmbito econômico: quando o PIB vai bem ou quando o povo vai mal?

33. Até quando será possível aceitar a existência de um modelo econômico que gera riqueza produzindo pobreza?

34. Tem limites a insanidade econômica que faz uso da mão-de-obra infantil, escrava e desumana?

35. Até quando o modelo econômico continuará virando as costas para o drama de a cada cinco segundos uma morte acontecer ao redor do mundo devido à existência da fome e de doenças dela decorrentes?

36. Até quando a miséria em que muitos vivem (2,5 bilhões de habitantes, 40% da população mundial) continuará correndo em paralelo a exuberante riqueza de outros (15% da humanidade)?

37. Até quando um quinto da população mundial continuará não hesitando em gastar dois dólares por dia num simples cappuccino, enquanto outro quinto da população não tem esses mesmos dois dólares para tomar um suco de laranja ou um copo de leite?

38. Até quando os economistas vão continuar confundindo modernidade com desenvolvimento?

39. Até quando o modelo econômico que faz avançar a tecnologia conseguirá conviver, “pacificamente”, com a indiferença, a injustiça e a desigualdade social que sepulta, por ano, ao redor do mundo, seis milhões de crianças?

40. Pode a atividade econômica ser responsabilizada sozinha pelo grande número de espécies de animais e vegetais encontrarem-se em risco de extinção?

(*) Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor da FAC-FITO, do UNIFIEO e da Faculdade de Vinhedo. Mestre em Integração da América Latina (PROLAM-USP) e Especialista em Política Internacional (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), com curso pela Universidade de Havana (Cuba). Articulista do Portal Ecodebate e da Agência Zwela de Notícias (Angola). Tem textos publicados em Cabo Verde, Angola, Portugal, Espanha, México e Equador. Seu mais recente livro é “Pensando como um Economista”.
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